segunda-feira, 15 de julho de 2013

A COMISSÃO DA VERDADE PARA O CIDADÃO BRASILEIRO

Jean Gaspar

Rever a sua história, analisá-la para entender o passado do nosso Brasil, é também trilhar o caminho do ensino da verdade, da ética e, sobretudo, da preservação da vida para as futuras gerações. Muita gente como eu, presenciou a ditadura vivida por nosso país. Não cabe aqui ressaltar as diferentes lutas pela conquista da liberdade e pela construção da democracia.

Assim como no Brasil, existem no mundo todo, organizações nacionais chamadas de Comissões da Verdade que buscam apurar com mais eficácia e estabelecer a verdade sobre crimes e fatos não esclarecidos num certo momento da vida de um povo, de uma nação.

A título de exemplo, o caso do Canadá, onde há uma Comissão da Verdade que visa apurar e sensibilizar a população sobre maus tratos sofridos durante anos por ex-alunos indígenas em colégios e pensionatos e suas consequências devastadoras para suas comunidades. Temos a Comissão da Verdade em Ruanda que apurou o genocídio ocorrido em 1994 com quase um milhão de mortes, e a da África do Sul sobre o Apartheid.  Essas comissões atuaram como tribunais civis que serviram para descobrir a verdade e os motivos pelos acontecimentos graves. Outros países próximos, como Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai, também têm as suas Comissões da Verdade.

No caso do nosso país, caminhos sinuosos e tortos marcaram a sua trajetória, com violências, torturas, execuções extrajudiciárias e desaparecimentos forçados. Saber o que aconteceu de fato, trazer para as vítimas um semblante de paz por descobrir a verdade, é uma forma de chegar ao perdão. Apesar da anistia geral, a verdade é essencial, pois ajudará as vítimas diretas a entender os crimes que as atingiram, facilitará o reconhecimento público dos seus sofrimentos. Para as famílias das vítimas, esclarecimentos sobre a forma como ocorreram os crimes, os desaparecimentos, servirão para curar as feridas e, para a sociedade, detalhes dos acontecimentos, em que condições se produziram as violações, e suas razões para que tais fatos não aconteçam mais e permaneçam na memória.


É nesse âmbito que foi criada pelo Executivo, a Comissão Nacional da Verdade, através da Lei 12528/2011 e instituída em 16 de maio de 2012. Essa Comissão tem por finalidade apurar as graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. Para isso, diversos grupos de trabalhos, vão pesquisando fatos como o golpe de 1964 e os crimes decorrentes, as doutrinas e ideologias que serviram de base para repressão, a própria estrutura da repressão, as violações de Direitos Humanos ocorridos, como é o caso da morte do jornalista Vladimir Herzog ou do desaparecimento do deputado Rubens Paiva, as violações contra os índios na luta pela terra, a guerrilha do Araguaia, as violências sexuais contra mulheres, suas consequências e impactos, sobretudo aquelas que participaram de forma ativa em movimentos de resistência. São todos esses fatos da nossa história que serão apurados e esclarecidos pela Comissão Nacional da Verdade.

É importante conhecer a verdade e por isso deve-se apoiar essa Comissão para que leve adiante um projeto tão valioso para o cidadão brasileiro, para nossa história. Não há dúvidas sobre a obviedade do perdão, por isso existe a anistia, porém é imprescindível que atores vivos desse passado sombrio do nosso país e o Estado, após apuração dos fatos, reconheçam os seus crimes e que o Brasil caminhe na conscientização da consolidação da democracia e das liberdades.

Uma participação efetiva do povo brasileiro na busca pela verdade poderá trazer relatórios mais contundentes sobre o nosso passado, visto que essa comissão só terá dois anos para trazer suas conclusões, lembrando que há mais de um que ela foi instalada. O prazo é muito pouco para apurar décadas de violações dos Direitos Humanos e, em virtude da falta de conhecimento da população e a pouca divulgação a este efeito, há certa preocupação do verdadeiro impacto da atuação da Comissão e dos seus relatórios.

Vale acompanhar o trabalho dessa Comissão e torcer para que os relatórios que vão sendo publicados à medida que são concluídos, sejam difundidos e incorporados em materiais didáticos, livros e bibliotecas, para a posteridade. Estaremos divulgando a nossa história e preparando as futuras gerações sobre a importância de salvaguardar a democracia, as liberdades individuais e coletivas e valorizar a vida.

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