Jean Gaspar
Na semana passada, o coordenador do grupo de trabalho responsável por propor a reforma política, deputado federal Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse que o texto não deve ser votado pelo Congresso Nacional até outubro deste ano, prazo necessário para que as novas regras já valessem nas eleições do ano que vem. Uma perda de oportunidade de atender ao clamor dos brasileiros, insatisfeitos com a situação atual, como ficou claro com as recentes manifestações populares.
Este é o momento, portanto, de nós, brasileiros, entendermos o que está acontecendo, como funciona nosso sistema eleitoral, suas distorções e o que pode ser melhorado. Como o assunto é complexo, vamos abordá-lo por partes.
O sistema eleitoral brasileiro atual é incompatível com o grau de modernidade que o país alcançou, pois mina qualquer esforço de consolidação de partidos efetivos, reforçando o comportamento individualista dos políticos e impedindo a construção partidária. Nossa legislação estimula os baixos índices de fidelidade e disciplina partidária.
Dentre as inúmeras distorções de nossa legislação eleitoral, destaca-se o sistema proporcional para eleição de deputados federais, deputados estaduais e vereadores. Como funciona hoje? O primeiro passo na eleição proporcional é definir os votos válidos do estado (no caso de deputados federais e estaduais) ou do município (no caso dos vereadores), subtraindo-se os brancos e nulos do total. O número de votos válidos é então dividido pelo número de vagas em disputa, e o resultado é o quociente eleitoral. Em seguida, os votos de cada partido são divididos pelo quociente eleitoral, e o resultado é o quociente partidário. Desprezadas as frações, esse resultado é igual ao número de cadeiras que cada partido vai ter. Supondo que uma legenda tenha direito a cinco cadeiras, são considerados eleitos seus cinco candidatos mais votados.
Só entram na distribuição dos lugares os partidos e as coligações que alcançarem quociente partidário igual ou maior que um: caso contrário, mesmo tendo um candidato com grande votação isolada, o partido não elege deputados.
Vejamos um exemplo prático. Pela Constituição atual, São Paulo elege 70 deputados federais. Suponhamos que o Estado tenha 700 mil votos válidos. Se dividirmos 700 mil por 70, o quociente eleitoral seria de 10 mil. Ou seja, a cada 10 mil votos que o partido ou coligação recebe, elege um deputado. Se a legenda tiver 25 mil votos, elegerá dois deputados (25 mil divididos por 10 mil é a 2,5). Se tiver 9.900 votos, não elege nenhum.
As vagas restantes são chamadas de sobras e devem ser preenchidas usando-se o método das médias ou distribuição das sobras. Divide-se o número de votos válidos atribuídos a cada partido pelo número de lugares por ele obtido, mais um, cabendo ao partido que apresentar a maior média um dos lugares a preencher. Esta operação se repete até a distribuição das cadeiras que faltam. Só podem concorrer à distribuição dos lugares os partidos e coligações que tiverem obtido o quociente eleitoral.
A questão fundamental é que este sistema gera alguns disparates, que marcaram a nossa história política recente. Um caso clássico foi a eleição em 2002 do médico Eneas Carneiro (conhecido pelo bordão “Meu nome é Eneas!”), pelo Prona, que teve 1,5 milhão de votos sozinhos, fazendo com que seu partido conseguisse eleger mais cinco deputados inexpressivos, com menos de 500 votos cada. No mesmo ano, políticos tradicionais com mais de 100 mil votos acabaram não se elegendo.
Também marcante foi o caso do estilista Clodovil Hernandes. Foi eleito deputado federal em 2006 com mais de 500 mil votos. Quando faleceu em 2009, sua vaga foi ocupada por seu suplente, o coronel Paes de Lira, contrário à união homossexual e que teve apenas 7 mil votos. Seu substituo nada tinha a ver com sua plataforma eleitoral.
Exemplos como esses demonstram que nosso sistema eleitoral não favorece a representação dos desejos e anseios da população, nem da maioria, nem das minorias. Apesar de ter como princípios assegurar que a diversidade de opiniões de sociedade esteja refletida no Legislativo e garantir uma correspondência entre os votos recebidos pelos partidos e sua representação, na prática, o atual sistema proporcional não reflete as clivagens sociais.
A questão fica ainda mais claro quando se leva em conta a representação dos Estados da federação mais populosos em relação aos menos populosos. Há uma completa desproporcionalidade.
Este é o momento, portanto, de nós, brasileiros, entendermos o que está acontecendo, como funciona nosso sistema eleitoral, suas distorções e o que pode ser melhorado. Como o assunto é complexo, vamos abordá-lo por partes.
O sistema eleitoral brasileiro atual é incompatível com o grau de modernidade que o país alcançou, pois mina qualquer esforço de consolidação de partidos efetivos, reforçando o comportamento individualista dos políticos e impedindo a construção partidária. Nossa legislação estimula os baixos índices de fidelidade e disciplina partidária.
Dentre as inúmeras distorções de nossa legislação eleitoral, destaca-se o sistema proporcional para eleição de deputados federais, deputados estaduais e vereadores. Como funciona hoje? O primeiro passo na eleição proporcional é definir os votos válidos do estado (no caso de deputados federais e estaduais) ou do município (no caso dos vereadores), subtraindo-se os brancos e nulos do total. O número de votos válidos é então dividido pelo número de vagas em disputa, e o resultado é o quociente eleitoral. Em seguida, os votos de cada partido são divididos pelo quociente eleitoral, e o resultado é o quociente partidário. Desprezadas as frações, esse resultado é igual ao número de cadeiras que cada partido vai ter. Supondo que uma legenda tenha direito a cinco cadeiras, são considerados eleitos seus cinco candidatos mais votados.
Só entram na distribuição dos lugares os partidos e as coligações que alcançarem quociente partidário igual ou maior que um: caso contrário, mesmo tendo um candidato com grande votação isolada, o partido não elege deputados.
Vejamos um exemplo prático. Pela Constituição atual, São Paulo elege 70 deputados federais. Suponhamos que o Estado tenha 700 mil votos válidos. Se dividirmos 700 mil por 70, o quociente eleitoral seria de 10 mil. Ou seja, a cada 10 mil votos que o partido ou coligação recebe, elege um deputado. Se a legenda tiver 25 mil votos, elegerá dois deputados (25 mil divididos por 10 mil é a 2,5). Se tiver 9.900 votos, não elege nenhum.
As vagas restantes são chamadas de sobras e devem ser preenchidas usando-se o método das médias ou distribuição das sobras. Divide-se o número de votos válidos atribuídos a cada partido pelo número de lugares por ele obtido, mais um, cabendo ao partido que apresentar a maior média um dos lugares a preencher. Esta operação se repete até a distribuição das cadeiras que faltam. Só podem concorrer à distribuição dos lugares os partidos e coligações que tiverem obtido o quociente eleitoral.
A questão fundamental é que este sistema gera alguns disparates, que marcaram a nossa história política recente. Um caso clássico foi a eleição em 2002 do médico Eneas Carneiro (conhecido pelo bordão “Meu nome é Eneas!”), pelo Prona, que teve 1,5 milhão de votos sozinhos, fazendo com que seu partido conseguisse eleger mais cinco deputados inexpressivos, com menos de 500 votos cada. No mesmo ano, políticos tradicionais com mais de 100 mil votos acabaram não se elegendo.
Também marcante foi o caso do estilista Clodovil Hernandes. Foi eleito deputado federal em 2006 com mais de 500 mil votos. Quando faleceu em 2009, sua vaga foi ocupada por seu suplente, o coronel Paes de Lira, contrário à união homossexual e que teve apenas 7 mil votos. Seu substituo nada tinha a ver com sua plataforma eleitoral.
Exemplos como esses demonstram que nosso sistema eleitoral não favorece a representação dos desejos e anseios da população, nem da maioria, nem das minorias. Apesar de ter como princípios assegurar que a diversidade de opiniões de sociedade esteja refletida no Legislativo e garantir uma correspondência entre os votos recebidos pelos partidos e sua representação, na prática, o atual sistema proporcional não reflete as clivagens sociais.
A questão fica ainda mais claro quando se leva em conta a representação dos Estados da federação mais populosos em relação aos menos populosos. Há uma completa desproporcionalidade.