quinta-feira, 31 de outubro de 2013

EM DEFESA DA CULTURA NACIONAL

Jean Gaspar

Pouca gente sabe que no dia 31 de outubro comemora-se o Dia do Saci, um dos mais populares personagens do folclore nacional.

A data foi instituída oficialmente no Estado de São Paulo em 2004, e por várias cidades, com objetivo explícito de diminuir a importância crescente que se dava ao Halloween, o tradicional Dia das Bruxas norte-americano. Foi uma iniciativa de entusiastas da cultura brasileira para convidar as pessoas a conhecer e celebrar as criaturas míticas nacionais em vez das estrangeiras. Há projetos de lei para instituir a data no calendário nacional, mas permanecem arquivados. É hora de se retomar a questão.

Em tempos de globalização e de forte interferência da televisão, com uma programação em grande parte estrangeira, acabamos esquecendo nossas próprias origens e tradições. Tão grave como a perda da memória é a valorização crescente do que vem de fora e a consequente desvalorização do que é nosso.

Precisamos resgatar nossas raízes, para mantermos viva nossa própria identidade como povo.

As crianças nascidas nos anos anteriores à era da tecnologia da informação ainda tiveram a oportunidade de vivenciar as brincadeiras do nosso folclore, contos, lendas, músicas que fizeram parte do universo infantil, que por sua vez, refletiam na conduta humana. O problema é que as crianças atualmente não têm a oportunidade de brincar nas ruas. Mas com a ajuda do computador podem rever brincadeiras e músicas que fizeram parte da infância de seus pais e avós. O que falta para aumentar a valorização da cultura popular é unir tecnologia com tradição. Os jogos eletrônicos, por exemplos, poderiam conter brincadeiras populares, como desfrutar uma partida de bola de gude no computador, entre outras.

Precisamos resgatar nossas raízes, para mantermos viva nossa própria identidade como povo.  É triste vermos que a cultura popular é vista por muitos como subcultura. Mas esse cenário pode mudar. Ao poder público cabe desenvolver projetos de políticas culturais que tenham como foco a valorização das manifestações populares, de modo que nossas crianças tenham orgulho do saci, curupira, boitatá, mula sem cabeça e outros incríveis personagens da cultura brasileira.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A ARTE DE ENSINAR E FORMAR CIDADÃOS PARA O MUNDO

Jean Gaspar

A educação é, sem dúvida, o principal elemento de desenvolvimento humano e social. Mas, de nada adiantam as grandes teorias pedagógicas, o reconhecimento da importância da educação para a construção de uma sociedade mais justa, o investimento público em escolas e equipamentos, se os professores não forem devidamente valorizados e qualificados para suas atividades.

Afinal, é na sala de aula que o ensinar e o aprender se encontram e acontecem. E não só isso. Nesse processo, entram em jogo outras questões ligadas ao crescimento humano dos alunos: além de lidarem com a vida intelectual de seus estudantes, os professores os ensinam a serem mais humanos.

E isso é uma arte que envolve acolher uma criança ou jovem e acompanhar o seu desenvolvimento como ser humano. É conduzi-lo e nutri-lo. É estimulá-lo a descobrir por si só o mundo, os outros e a si próprio. É ajudar a conquistar a felicidade e a dignidade. É incentivá-lo para que se torne uma pessoa comunicativa, livre, responsável, aberta, tolerante, orgulhosa de sua herança cultural e conectada com seu tempo, com senso crítico e moral. 

O educador norte-americano William Arthur Ward aponta a diferença entre o bom professor e o mediano: este expõe e demonstra. Aquele explica e inspira. Fica claro, portanto, que a tarefa do professor não é meramente transmitir informações, mas, sobretudo, formar pessoas confiantes e críticas, com vontade de aprender, engajadas na sociedade e compromissadas com valores humanísticos, como respeito às diferenças, responsabilidade social, cooperação, consciência global e solidariedade.

Por isso, cabe a todos nós, sociedade civil e poder público, respeitarmos, admirarmos e valorizarmos nossos professores. Isso significa que é urgente investir na formação, remuneração e motivação de nossos docentes, para que se sintam prestigiados socialmente. Como explica o filósofo e educador Gabriel Perissé, “a docência tem de se tornar uma carreira promissora, e não uma carreira promissória... em que as promessas redundam em novas dívidas que nunca se pagam”. Isso pressupõe salários dignos, para que os professores possam exercer sua profissão com dignidade. Essa deve ser nossa prioridade. Só assim estaremos mostrando de fato às gerações mais novas o valor desse nobre ofício e o quanto aprender é um bem valioso a todos nós.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS


Jean Gaspar

Segundo dados do Censo de 2010, o Brasil possui atualmente mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, o que representa quase 24% da população. Deste total, mais de 13 milhões são deficientes físicos. Uma minoria que supera a população de países como Portugal, Bélgica, Israel, bem como os nórdicos, como Suécia, Dinamarca, Finlândia e Noruega. 

Temos, portanto, um país dentro de um continente e que merece a devida atenção e respeito. Muito se avançou nos últimos anos, com políticas públicas voltadas ao acesso à educação, à inclusão social, à acessibilidade e à atenção à saúde. Mas a realidade ainda está longe de ser a ideal. Por isso, nesta semana em que se celebra no Brasil o Dia do Deficiente Físico, voltamos nosso olhar para as reais condições existentes, de modo a lançar luzes para as ações prementes, em especial no que se refere ao acesso à educação. 

Um dos principais desafios da educação é justamente tornar a escola acolhedora das diferenças de seus alunos e alunas. Isso porque a instituição escolar foi tradicionalmente voltada aos públicos que correspondiam a um padrão de normalidade. Daí que transformá-la em uma instituição inclusiva ou aberta às diferenças implica rever o próprio conceito da escola frente à diversidade e repensar a formação de professores para essa nova realidade. Significa reavaliar o próprio papel da educação escolar na sociedade. 

A escola inclusiva está afinada com os direitos humanos, pois respeita e valoriza todos os alunos, cada um com suas características individuais. Ela acolhe e se modifica para garantir que os direitos de todos sejam respeitados. Não se trata de uma moda passageira, mas sim do resultado de estudos e discussões em todo o mundo, que enxerga a educação como lugar para o exercício da cidadania. 

A inclusão exige um processo de mudança e de reestruturação das escolas como um todo, de modo a assegurar que todos os alunos tenham acesso a todas as oportunidades educacionais e sociais que a escola oferece, incluindo o esporte, o lazer e a recreação, ao mesmo tempo em que impede a segregação e o isolamento. Isso significa mudar o sistema educacional, até então focado no ajustamento do aluno às demandas escolares, a sua integração, que significa apenas o preparo e adaptação do aluno à escola. Um modelo fundamentado numa política de inclusão vai além da integração e envolve a remoção dos obstáculos que impedem a participação das pessoas com deficiência na vida em sociedade. 

Não basta pôr a criança na escola. É preciso criar mecanismos de união entre escola, família e sociedade. Ao poder público, cabe investir na materialidade das escolas, na formação dos professores para que atuem profissionalmente com a criança, integrando-a na sociedade como cidadão e na valorização dessa atividade. 

Há muitos desafios a serem superados. Em termos econômicos, é evidente que a escola inclusiva tem um custo mais elevado, até porque a estrutura física da escola precisa ser adaptada. Mas o investimento que hoje é feito em clínicas e escolas especiais pode ser revertido para o processo de inclusão. 

Também é necessário preparar o professor para lidar com o aluno deficiente, bem como no âmbito pedagógico é preciso rever todo o sistema escolar, envolvendo a questão do currículo e da avaliação. Enfim, são muitos os desafios e questionamentos ainda sem respostas prontas, mas que se colocam como imperativos para uma sociedade que busca a equidade de oportunidades e direitos para todos.

O importante é pensarmos na inclusão não como um fim em si, mas como um processo do qual todos nós somos partícipes e responsáveis. Só assim mães e pais podem se sentir verdadeiramente apoiados para desempenharem seus papéis de educadores, que nada mais é que cuidar de todos os membros de suas famílias.  Assim eles terão garantidas a valorização e a aceitação das diferenças de seus filhos.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

POLÍTICAS PÚBLICAS E AÇÕES EM PROL DO IDOSO



Jean Gaspar

O Brasil está mais velho. Assistimos nas últimas décadas a uma drástica mudança no perfil da população brasileira. E isso está acontecendo em nível mundial. Com a queda nas taxas de natalidade e os avanços científicos na medicina, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, por volta de 2025, haverá mais idosos do que crianças no planeta. O organismo das Nações Unidas considera o período de 1975 a 2025 como a “Era do Envelhecimento”.

Este acelerado processo de mudança demográfica está repercutindo em todos os aspectos da vida social, particularmente porque muda a cultura de valorização prioritária de crianças e jovens.

Nessas circunstâncias em que a população idosa cresce mais do que a infantil, é imperativo olharmos para esse grupo etário. No Brasil, desde 1999 comemora-se o Dia Nacional do Idoso, estabelecido pela Comissão de Educação do Senado Federal como momento para refletir a respeito da situação do idoso no país, seus direitos e dificuldades. Até 2006, a data era celebrada no dia 27 de setembro, mas como o Estatuto do Idoso foi criado em 1º de outubro de 2003, foi transferida para esse dia.

Esta semana, portanto, é oportuna para voltarmos nosso olhar para a terceira idade. Afinal, o mundo hoje está pronto para os jovens, porque outros jovens – que hoje estão na velhice – o prepararam para nós. E é para lá que caminhamos, se a vida não for interrompida antecipadamente.

Muito já avançamos no sentido de resgatar o devido respeito. A própria existência de um Estatuto do Idoso já o comprova, bem como a criação de conselhos em nível federal, estadual e municipal. Hoje, em qualquer estabelecimento público há atendimento preferencial aos que têm mais de 60 anos. Mas ainda há muitos direitos previstos no papel que estão longe de tornarem-se realidade. Há demandas específicas e necessidades ainda não atendidas pelas políticas públicas.

Por lei, todos têm direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante a qualquer pessoa com mais de 65 anos o direito a uma renda básica de um salário mínimo. Entretanto, segundo a pesquisa Idosos no Brasil – Vivências, desafios e expectativas na terceira idade, realizada pelo Sesc e Fundação Perseu Abramo, apenas 1% dos idosos declaram receber o benefício. Mesmo que este número tenha sido ampliado desde a realização da pesquisa, é urgente que sejam adotadas medidas que aprimorem o acesso ao BPC, de modo a garantir sua universalização, especialmente à parcela mais pobre da população, para que possam prover o próprio sustento e participar ativa e dignamente da vida em sociedade.

A sociedade que investe no idoso está construindo os alicerces de seu próprio futuro.

Ainda há muitos mitos e preconceitos a serem vencidos em relação à velhice. A principal percepção dos jovens refere-se à incapacidade, tanto pelas limitações funcionais como psicológicas, passando também pelas desvantagens socioeconômicas e culturais. Vemos então que as políticas públicas estão falhando no cumprimento de dois tópicos do artigo 3º do Estatuto do Idoso: a viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio com as demais gerações e o estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento. O poder público precisa incluir em sua pauta a educação de jovens sobre o envelhecimento, pois somente por meio da troca de experiências, saberes e expectativas entre gerações será possível superar o preconceito e a superação, garantindo os direitos das pessoas mais velhas ao envelhecimento ativo.

Outra tarefa premente é a divulgação do Estatuto do Idoso entre os próprios idosos. A pesquisa citada indica que 27% deles nunca ouviram falar a seu respeito. E é justamente a parcela mais carente da população, tanto em termos econômicos como escolares – e que mais se beneficiaria de seus benefícios – que o desconhece.

A violência contra o idoso ainda é alarmante. 36% dos pesquisados revelaram já ter sofrido violências como ofensas, ironias, humilhações e menosprezo, tanto no âmbito público como no ambiente familiar. Nossa sociedade é omissa em relação ao tema.

Na saúde, acessibilidade e educação, a carência também é enorme. Falta uma política pública de saúde do idoso. Falta um pensar a organização territorial das cidades para assegurar a inclusão do idoso, assim como dos portadores de necessidades especiais. Na educação, faltam ações dirigidas especificamente a essa faixa etária, pois é sabido que o menor nível de escolaridade reflete nos cuidados com a saúde, na empregabilidade e renda, na convivência intergeracional. E aí entra especialmente o acesso às novas tecnologias, cuja falta de domínio amplia ainda mais o fosso, causando exclusão social.

O descumprimento do Estatuto do Idoso também acontece em seu artigo 20: “O idoso tem direito a educação, cultura, esporte, lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua peculiar condição de idade.” Na maioria dos municípios brasileiros, as opções são praticamente inexistentes.
O Poder Público pode e deve mudar esse cenário, fortalecendo o município como local privilegiado para as ações de inclusão e proteção do idoso. Cabe-lhe também prover recursos para tanto, bem como promover na sociedade a conscientização das demandas do processo de envelhecimento, mobilizando a opinião pública. E, sem dúvida, envolver o próprio idoso na discussão e formulação de políticas públicas, como lhe assegura o Estatuto.
 
Nesse Dia Nacional do Idoso, esperamos que nossos governantes comprometam-se com políticas que contemplem as necessidades e direitos já previstos em lei. A sociedade que investe no idoso de hoje está construindo os alicerces de seu próprio futuro, baseado na dignidade, liberdade e convivência social.